sexta-feira, 3 de setembro de 2010

A Verdade Pode Ser Simples Demais

Muito cedo, na nossa infância, na descoberta do universo que nos cerca, tomamos consciência do “eu” e do “meu” e diferenciamo-nos, assim, do “tu” do “teu”. Essa percepção de separação nos induz a ver o mundo e nos posicionarmos a partir do ego, que nada mais é do que um programa de gerenciamento, um “software”, de controle e proteção do nosso corpo e da nossa individualidade, através da qual nos relacionamos com aquilo que o ego considera ser “o mundo externo”.

As primeiras experiências da vida vão-nos tomando de assalto e começamos a reagir a elas com a perfeita sensação de que estamos no comando da nossa história. Quando as coisas acontecem de acordo com o que imaginamos, com o que planejamos, sentimos que fomos competentes, inteligentes, hábeis para dominar os acontecimentos e produzir aquilo que desejávamos. Quando o resultado acontece em desacordo com a nossa idéia inicial, mesmo tendo feito “a nossa parte”, costumamos atribuir a responsabilidade pelo insucesso aos outros, que não fizeram adequadamente o seu papel, ou a fatores como “sorte ou azar”.

Com o passar dos anos e com a observação das nossas próprias histórias de e das histórias das pessoas que nos cercam, em muitos momentos começamos a suspeitar de que existe algo além da simples seqüência de acontecimentos caracterizados por uma corrente infindável de causa e efeito, através de uma linha histórica que se estende para trás a se perder no passado.

É quando começam a surgir as primeiras manifestações espontâneas da espiritualidade. É quando começamos a desconfiar de que existe algum significado oculto nas nossas vidas e como se “alguém” ou alguma forma de “inteligência” estivesse manipulando os acontecimentos, em especial aqueles que, antes, classificávamos como “sorte ou azar”: os eventos interligados com relações acausais.

Este seria, talvez, o desenvolvimento natural da compreensão do ser humano a respeito de quem é, como é o mundo e qual o seu papel nesta vida.

Os homens, entretanto, com a sua mania de institucionalizar, acabam criando agrupamentos religiosos que têm, invariavelmente, o vício de querer ensinar dogmaticamente aquilo que só pode ser apreendido através da percepção individual e espontânea, a partir da vivência da própria história pessoal. Desse modo, a descoberta natural da espiritualidade acaba sendo substituída por crenças cegas, estéreis e sectárias, preconceituosas, ou abafada pela rebeldia adolescente, conduzindo ao materialismo científico, igualmente estéril, sectário e preconceituoso.

Ambos os lados, através de seus líderes e expoentes, chamam para si a posse da verdade absoluta. Ocorre que a Verdade não tem dono, é livre e paira no ar, misturada nas lendas religiosas e nas descobertas científicas; percebida nas preces atendidas e nos experimentos de laboratório. Talvez, uma mesma Verdade, para ser reconhecida, precise estar visível de todos os ângulos, tanto nos textos sagrados milenares, quanto nas últimas descobertas da Física Quântica; tanto na arte da Astrologia, quanto nas palavras dos profetas; tanto nas comunicações com espíritos, quanto nas pequenas “coincidências” do nosso dia-a-dia, às quais nem sempre damos a devida atenção.

Talvez a melhor maneira de recuperarmos uma forma saudável de desenvolvimento físico, mental e espiritual seja abandonando nossos preconceitos e julgamentos. Temos de voltar a ter o espírito puro e desarmado da criança que éramos antes de sermos catequizados ou antes de termos nos rebelado contra os dogmas religiosos que os nossos pais e professores tentavam nos presentear.

Algum tempo atrás, tive um exemplo bem claro desse comportamento limitante a que as pessoas se impõe, ao que parece, pelo medo de se defrontar com as frágeis estruturas lógicas da sua visão de mundo. Seja religiosa ou científica, espiritual ou materialista. Presenteei a dois amigos – um padre e um materialista – com meu livro, recém publicado, Sincronicidade Absoluta – A ilusão do Livre-Arbítrio. A ambos pedi que lessem e me enviassem uma crítica, por e-mail. Passados alguns meses, encontrei o amigo ateu, materialista, e perguntei o que ele tinha achado das idéias do livro, se eram coerentes ou se ele tinha encontrado falhas na estruturação dos argumentos. Um pouco constrangido, ele foi sincero em reconhecer que não o tinha lido. Disse que ao ler o índice e verificar que, ao final, o livro falava de Deus, do Sentimento Oceânico, ele não se interessou pelo assunto, pois não acreditava naquilo.

Recentemente, encontrei o meu amigo padre e lhe fiz a mesma pergunta. Ele disse: “Eu só li o começo, pois quando vi que o livro tinha um conteúdo científico e materialista, que vai contra as minhas crenças, não fui adiante.”

A ambos fiz apenas uma pergunta, que não puderam me responder. Ao padre, perguntei: “Se Deus é onisciente e conhece o passado e o futuro, sabendo tudo o que vou fazer amanhã, como posso ter Livre-Arbítrio ou ser julgado pelos meus atos se, certamente, não vou surpreendê-Lo?”. Ao materialista perguntei: “Se experimentos científicos já demonstraram que os átomos podem ser constituídos apenas de energia e informação, sem nada sólido, qual a diferença de “matéria-prima” entre a realidade que percebemos depois que toca o despertador e aquela, um pouco antes, enquanto um simples sonho nos provocava sensações e emoções tão vívidas quanto as da “vida real”?

É possível que textos milenares, como o Bhagavad Gita, da Índia, não tenham a intenção de fazer metáforas e sejam simplesmente literais, em trechos como: “Tendo aprendido a verdade, a ilusão vai ter um fim, então você vai saber que todos os seres vivos, fazendo parte de Mim, pertencem somente a Mim e vivem dentro de Mim”. Seria essa a nossa “realidade”? Seríamos todos personagens de um sonho?

Mais adiante, na mesma obra, de mais de cinco mil anos, encontramos: “Sendo a Suprema Pessoa, sei tudo o que aconteceu, tudo o que está acontecendo e tudo o que vai acontecer.(…)”. Seria esta uma explicação para as incontáveis profecias, clarividências, precognições, fartamente registradas na história, de eventos que se concretizaram, em detalhes, exatamente da forma como foram “pré-vistos”, meses, anos ou centenas de anos antes dos fatos ocorrerem?

Ainda no Bhagavad Gita, temos, literalmente: “O Supremo Senhor Deus reside no coração e dirige cada passo de todos os seres vivos, que estão como em uma máquina movida pela energia da matéria natural.” Seria esta uma indicação de que todo o universo, os planetas e as pessoas, funcionam sincronicamente? Seria esta uma explicação para a inegável correlação estudada pelos astrólogos entre os astros e a nossa vida aqui na Terra? Seria essa a razão de que tantas “coincidências” se apresentem em nossa vida, levando-nos a desconfiar de que fazemos parte de uma “trama” que se desenrola além do nosso controle? Talvez a Verdade jamais se manifeste de modo inquestionável, simples e arrebatadora, perante todas as religiões, filósofos e cientistas. Talvez continuemos mais alguns milhares de anos discutindo religião, filosofia e ciência como membros de diferentes partidos políticos ou times de futebol. Talvez a Verdade já tenha sido descoberta milhares de anos atrás e dita de uma forma tão simples que os homens de hoje, com suas mentes tão complexas e eruditas, não consigam mais compreender.


Celso L. Rossi

autor do livro

Sincronicidade Absoluta – A Ilusão do Livre-Arbítrio

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